segunda-feira, 20 de junho de 2011

Entrevista com Olivier Anquier

O início de sua relação com o Brasil não é um caso à parte. Todos os anos turistas franceses vêm ao país a passeio, se encantam e decidem ficar. Muitos casam, constituem família, compram imóveis. Alguns viram ícones da gastronomia. Mas poucos se tornam celebridades, apresentam programas de tv, viajam o país em um fusca verde, atuam em peças de teatro, escrevem livros... Olivier fez tudo isso graças a um talento: fazer pão!
Ele não se diz chef porque, apesar de famoso por seus pratos, nunca estudou formalmente para isso. Apresenta o programa de TV Olivier Fusca e Fugão, mas não se considera apresentador, pois o que aprendeu sobre as câmeras foi durante sua carreira de modelo. Sobe aos palcos no espetáculo comemorativo dos dez anos de seu programa, mas não é ator (garante que não saberia interpretar ninguém além de si mesmo). Ensina receitas, mas também não quer que o chamem de professor, diz que apenas repassa conhecimento. O título de padeiro sim, ele abraça com orgulho, mas isso seria muito pouco para definir este galã de 49 anos. Olivier simplesmente não se deixa rotular, acredita que a “etiqueta” é o de menos, o que vale é o conteúdo. E isso ele de tem de sobra, como você pode conferir na entrevista a seguir.
Chegamos ao Hotel Bourbon numa tarde tipicamente curitibana, cinza e fria. Anquier estava na cidade para uma noite de autógrafos do seu livro Diário de Olivier. Com pontualidade quase britânica, o chef francês surgiu na sala onde faríamos a entrevista. Vestindo uma calça vermelha que combinava com o aro dos óculos, ele esbanjava simpatia e mostrava porque já esteve entre os 10 maiores modelos internacionais (talento comprovado durante nossa seção de fotos). Mas na hora da conversa ele não deixa dúvidas: sua paixão é pela comida.
 
O que você acha que explica o fascínio que nosso país exerce sobre os franceses?
  • Eu acho que o povo francês é a sociedade que tem o maior carisma pelo Brasil no mundo. Isso é inclusive uma característica cultural do povo francês, que é esse gosto, esse interesse, essa necessidade de descobrir o diferente. O que é diferente daquilo que eles têm. Você vê isso através desse relacionamento com o Brasil.
 
Em contrapartida, os brasileiros também demonstram uma admiração pelos franceses. Você acredita que o fato de ser estrangeiro, ter sotaque, colaborou com o sucesso que você conquistou por aqui?
  • Eu acho que todas as culturas ocidentais têm duas escolhas: Estados Unidos ou França. Porque, pra começar, a França criou a democracia: a Revolução Francesa foi o detonador de uma mudança completa no mundo Ocidental, o fim do roialismo e a manifestação da voz do povo, da voz do cidadão. A segunda coisa é tudo o que a França trouxe: a culinária _ a base da culinária do mundo é francesa (mesmo os italianos reclamando, não deixa de ser francesa). A base do luxo, de tudo que dá brilho, é francesa. Perfume, moda, tudo isso vem de lá. Então isso cria, efetivamente, um olhar de muito carisma e carinho com relação à França. E Estados Unidos é o país do novo mundo, né? No mundo hoje você escolhe um campo ou outro, o campo da evolução do poder ou o campo mais ligado à sensibilidade, que é a França.
 
No Brasil existe certo preconceito com algumas profissões, incluindo a de padeiro. Você acredita que tenha mudado a visão das pessoas sobre essa profissão?
  • Não acredito que seja eu quem tenha que dizer isso, porque seria até prepotência da minha parte. Mas eu sei que fiz um trabalho em 1995 que ajudou muito na posição do produto “pão” dentro da realidade do Brasil. Até então o pão era um monoproduto, e quando se fala em monoproduto, se fala em monotonia. Era um complemento alimentar. Ele ficava no fundo da padaria e o padeiro, que pra mim significa quem faz e vende pão, utilizava o pão e o fluxo que ele gera pra vender outras coisas, porque ele não acreditava que o pão podia ser realmente o negócio dele. O brasileiro naquela época, até o início do plano real, não viajava (a não ser a elite), então não tinha referência. E não sabendo, vai exigir o que? Nada. A gente começa a exigir a partir do momento em que nós temos referência. Eu estava preocupado em fazer evoluir o mundo dos pães. Talvez, efetivamente, eu tenha ajudado a mudar um pouco esse estereótipo do profissional.
  • O que mudou bastante depois do meu trabalho, foi o comportamento do brasileiro, a forma dele se relacionar com o pão. Porque hoje em dia ele vai no supermercado, na padaria e procura outros pães que não sejam necessariamente o pãozinho francês. Outra coisa muito importante é a cara das padarias, que mudou. Antes era aquela padaria na qual você não ia. Talvez quem ia era a pessoa que trabalhava na sua casa, mas você não ia. Hoje em dia você vai na padaria com prazer, porque é programa. Então acredito que eu tenha ajudado, de uma forma determinante na mudança no mundo das padarias no Brasil.
Você se auto-denomina chef, padeiro, cozinheiro ou apresentador?
  • Eu sou muito difícil de colocar etiqueta. Porque se começar a colocar etiqueta vai precisar de um livro. De tantas coisas que eu faço!

Se tivesse que escolher entre os fogões e as telas de tv, ficaria em dúvida? Voltaria a apresentar um programa que não tivesse nada a ver com culinária (como na época em que foi cobrir a Copa do mundo na França para a Globo por exemplo)?
  • Eu nunca troquei nada. Tudo que eu fiz, por mais distante que pareça, estava ligado. Do pão a chegar no palco. O pão teve um impacto midiático muito forte, gerou um reconhecimento do meu trabalho, que fez com que me convidassem a fazer um programa de culinária em 96, na TV Record. Eu comecei indo bem nessa nova experiência porque antes disso fui modelo por nove anos. Inclusive essa foi uma profissão que eu comecei aqui no Brasil, por sobrevivência. Nunca me olhei no espelho e disse “esse cara vai virar modelo”. Foi por necessidade.
  • Vim passar um mês de férias no Brasil, esse mês se esticou, eu tinha 20 anos de idade, e a partir daí chegou uma hora em que eu tinha que trabalhar né, fazer alguma coisa. Eu não falava nada de português e um amigo meu, francês que estava no Rio de Janeiro falou “por que você não vira modelo?” Aí entra o preconceito, e outras coisas, mas ele disse “você não precisa falar pra fazer isso”. Falei “tá certo”. Foi determinante pra que eu decidissse fazer aquilo pelo menos momentâneamente, pra depois poder fazer algo que correspondesse mais ao que eu realmente gostaria de fazer. Acontece que eu gostei. Eu fiz isso durante nove anos, e devido à minha curiosidade eu aproveitei muito dessa profissão. Viajei muito, conheci muitas pessoas e principalmente, eu aprendi o que é saber transmitir uma mensagem. O que é CO-MU-NI-CAR. Até hoje, enquanto eu estou falando aqui com você, acredito que eu sei como me comunicar, passar aquilo que eu desejo que seja passado. Essa profissão então foi determinante, no momento em que me econtrei na frente das câmeras apresentando culinária, porque essa não é minha profissão, eu não estudei pra isso. Simplesmente me inspirei na filosofia do meu pai, que era médico, mas que era apaixonado pela culinária e pela magia, pelo prazer que esse mundo pode trazer. O que eu ensino, ou melhor, o que eu repasso, (não gosto de falar a palavra ensinar porque eu não sou professor) é justamente essa filosofia do meu pai, essa paixão por esse mundo que envolve muito mais que cozinhar. Envolve o prazer da boca, o prazer de proporcionar prazer às pessoas e o simbolismo da mesa: a união, o diálogo, o compartilhamento. Tudo isso eu repasso. Por isso não posso me colocar uma etiqueta de chef, porque eu não sou chef, seria até desrespeitoso com os chefs que estudaram, que sofreram pra isso. Eu não.
E a denominação é o de menos...
  • Exatamente, não preciso de etiqueta, o que importa é a essência, o conteúdo.
E a chamada “alta gastronomia”? Você acha que existe mais incentivo ao surgimento de novos chefs hoje no Brasil?

  • Esse não é o meu mundo. Mas com certeza está mais aberto, o Brasil está evoluindo né, graças a Deus. Nesses últimos sete anos a evolução do Brasil foi muito grande... A partir do momento em que a economia começou a se estabilizar, e começou a se trazer coisas de fora e que o brasileiro começou a poder viajar, mudou tudo, porque ele começou a ter referência, para uma sociedade evoluir ela precisa de referência.

Você sempre comenta sobre essa importância de viajar para buscar referências, e você fez isso através do programa Olivier Fusca e Fogão, passando por inúmeros lugares do nosso país. Qual lugar que você ainda quer conhecer?

  • Essa pergunta é difícil, eu não posso te falar apenas um lugar. Tenho certeza que têm muitas coisas para descobrir que eu nem mesmo ouvi falar. Eu gosto do inesperado, do que a curiosidade e a observação podem proporcionar. Esse é um dos maiores prazeres que eu tenho. Quando além disso eu consigo levar junto comigo o telespectador, aí eu sou feliz, aí é a glória.

Como está sendo a sua experiência nos palcos?

  • Há dez anos venho viajando pelo Brasil fazendo uma maratona de palestras por todas as capitais. Essas aulas-show que eu faço me colocaram em frente a um público volumoso, com apenas minha bancadinha, microfoninho, a minha receitinha... E meu gogó segurando durante duas horas. Então criei uma intimidade muito grande com o público. Tinha que transformar isso em espetáculo, e foi o que nós fizemos. Então o mais difícil já estava definido e trabalhado ao longo desses dez anos, só que não era um trabalho mediático, eram eventos, palestras, conferências, seminários, feiras. Por isso quando eu cheguei de repente com esse projeto comemorativo de dez anos do Diário do Olivier criei uma surpresa muito grande: “olha, agora o padeiro virou ator!”, era o que comentavam. Então, três meses de temporada em São Paulo, pra mim está sendo sensacional. Primeiro a realização de um projeto com sucesso. Segundo, a glória de ter invertido o preconceito. A imprensa foi muito dura comigo, é normal. E a mesma imprensa, depois que assistiu ao espetáculo, fez críticas maravilhosas. É isso aí que é a minha glória. O prazer de proporcionar prazer às pessoas.
Os seus filhos demonstram inclinação e vontade de trabalhar com culinária? Você gostaria que eles seguissem esse caminho?

Eu me relaciono com eles exatamente como meu pai se relacionou comigo. O meu pai queria que eu fosse médico como ele, mas eu peguei dele duas paixões: a culinária que virou a minha atividade profissional maior, e a fotografia. Eu tenho um arquivo de fotografias do Brasil gigantesco, que não é artístico, não é profissional, não é folclórico, mas é autêntico. Então eu ilustrei O Diário de Olivier com as minhas fotos.
Você tem projetos de novos livros?

  • Ah, vai ter, imagina! Dez anos de viagem, mais de 450 histórias, aventuras, personagens do Brasil... Vai ter o volume dois, três, o de Portugal...
 
Qual foi a reação da sua família na França quando você decidiu que ia morar no Brasil?
  • A minha família na França é muito explosiva. Minha mãe tá na Austrália, por exemplo. Há trinta e poucos anos casou com um canguru (risos) e foi pra lá com três irmãos meus. Daí minha irmã foi pra Inglaterra. Então nós não somos exatamente uma família clássica.

Então eles encararam com naturalidade a sua decisão de morar no Brasil?

  • Até porque eles são iguais (risos). O meu percurso de vida é muito particular, eu sempre fui bastante distante e solitário. Eu passei toda a minha infância, dos 7 aos 17 anos em um seminário jesuíta.
 
E até hoje você ainda mantém laços fortes com seu país e as pessoas de lá?
  • Sempre. Eu nunca rompi os laços. Eu tenho uma relação muito forte com a França porque não deixa de ser a minha terra. E o fato de eu ser francês faz com que eu tenha essa cultura do gosto pela diferença. Teve uma época da minha vida em que eu estava fora do pensionato, e a minha mãe morava em um barco, no rio Sena. A minha janela dava para a Torre Eiffel, mas ela estava ali e eu nem via, tá entendendo? As pessoas não enxergam as coisas que estão perto delas. Para mim hoje, cada curva, cada esquina é uma surpresa, por mais que seja uma coisa simples. Aí é que tá: a magia está nas coisas mais simples, quanto mais simples melhor, mais rico.
 
 
 

Entrevista com Chef da Unilever

Luiz Farias é o chef executivo de uma das maiores redes de foodservice do Brasil. Entenda um pouco mais sobre o trabalho do chef e as diferenças entre comandar as panelas de um restaurante ou os produtos alimentícios de uma grande empresa.
 
Conte um pouco da sua trajetória na gastronomia, até chegar na Unilever...

Nasci no nordeste e vim muito jovem pra São Paulo. Quando tinha doze ou treze anos, meu pai já me colocou no fundo de uma cozinha para ajudar com o dinheiro em casa. E foi quando tudo começou. Depois de certo tempo, queria trabalhar num restaurante italiano conhecido, então fiz de tudo, inclusive ganhar menos da metade do meu salário. Hoje, dou orgulho pra família. Quando eu tinha 21 anos, a Unilever iniciou a formatação da operação food service no Brasil. Fui um dos convidados para participar da entrevista, pois já tinha participado de um curso na Unilever. Graças a Deus, depois de muitas entrevistas e um processo seletivo impressionante, com muita humildade, personalidade e transparência, fui passando, e depois de uns dois meses, fui convidado pra assumir essa vaga de chef no Brasil, aos 21 anos. Comecei a fazer treinamentos em países como Alemanha, Suíça, Itália, França, Portugal e Espanha. Também fiz a faculdade de Nutrição.
 
Porque você decidiu se especializar em sobremesas?
  • Logo quando comecei a trabalhar na Unilever, fiz um curso em Paris, na consagrada escola Lenôtre. Este curso me deu a confiança pra trabalhar, escrever e falar sobre culinária. Fiquei um período com os grandes chefs e foi praticamente um MBA em culinária. Lenôtre foi o maior chef do mundo em pâtisserie na história da culinária. Foi uma grande oportunidade de unir a experiência do profissional que eu sempre quis ser, aprendendo na escola dele. Lá, pude aprender todas as bases de confeitaria, já que todos os conceitos vêm dessa escola. Foi aí que comecei a me especializar em sobremesas. Também ganhei concursos em sobremesas, o que reforçou a minha especialidade.
Explique o conceito de foodservice para quem não está familiarizado...
  • O food service é o segmento que trabalha com alimentação fora do lar, como hotéis, restaurantes, cafeterias, etc. Na Unilever, temos uma empresa focada na divisão food service, a Unilever Foodsolutions. Ela possui operações em 65 países ao redor do mundo, sendo a maior empresa do segmento. Conta com a mais variada linha oferecida a donos de estabelecimentos comerciais e dispõe de um vasto conhecimento em alimentação profissional.
  • A crescente demanda pela alimentação fora de casa faz com que o mercado de food service incremente aproximadamente 9% ao ano. Atualmente, no Brasil, são 1,2 milhão de estabelecimentos, entre bares, restaurantes, hotéis, motéis, padarias, churrascarias e redes de fastfood, que consomem 1/3 de toda a produção da indústria alimentícia nacional. As compras desta cadeia somaram no ano passado R$ 68 bilhões.
 
Geralmente as pessoas associam o título de “chef” a quem comanda cozinhas de grandes restaurantes. Fale um pouco sobre a diferença entre a função de chef de cozinha e chef de uma grande empresa.
  • O chef de uma empresa tem o papel de falar com o operador. Eles não vendem produto, mas sim passam credibilidade e também orientam a forma correta de utilizar o produto. Os chefs executivos buscam soluções para o empresário e para o profissional dos restaurantes, com profissionalismo e seriedade.
 
Qual desses dois segmentos (chef de cozinha e chef de grande empresa) você considera mais favorável para quem está começando?
  • Quem está começando na profissão deve iniciar em cozinha profissional, literalmente acompanhar a rotina do dia-a-dia da cozinha, conhecer os conceitos, as técnicas, as dificuldades, a responsabilidade de entregar a comida na hora certa e todo gerenciamento, além de ter muita disciplina. Só com vivência profissional no mercado, um chef consegue trabalhar em grandes empresas. O papel de um chef em grandes empresas é também o de um formador de opinião para o mercado, pois temos o papel de treinadores, consultores, prestadores de serviços. Temos a responsabilidade de representar a empresa onde atuamos, levamos o nome e a marca em nosso uniforme, desenvolvemos produtos, conceitos e soluções aos usuários de nossos produtos. Desta forma, antes de trabalhar em grandes empresas, é importante ter uma boa experiência profissional.
 
Como é sua rotina de trabalho no CISC (Centro de Informações e Serviço ao Cliente) na Unilever?
  • No CISC (Centro de Informações e Serviço ao Cliente) da Unilever Foodsolutions, diariamente eu faço contato com o operador, para passar a credibilidade dos produtos que vendemos. Eu oriento sobre a melhor forma para ele utilizar o produto, elaborando e sugerindo receitas alinhadas com a necessidade do cliente. Todos os dias, minha equipe e eu buscamos soluções para os empresários de restaurantes.
 
Quais são algumas das estratégias usadas para garantir que os seus produtos sejam escolhidos pelos clientes?
  • Através do CISC (Centro de Informação e Serviço ao Cliente), que possui uma equipe de chefs experientes, oferecemos diversos treinamentos e auxílio técnico aos clientes. O CISC dá suporte na criação de cardápios, desenvolvimento de receitas, possui treinamento profissional e ainda conta com um sistema de atendimento 0800, para tirar dúvidas e dar dicas culinárias. Nossos clientes buscam muito mais do que a compra. Eles são ávidos por orientações para que realmente aproveitem o máximo dos nossos produtos e, assim, otimizem seus negócios.