segunda-feira, 27 de junho de 2011

História da Culinária Japonesa

Em contrapartida, a filosofia da arte culinária tradicional do Japão enfatiza algo paradoxal: “O ideal da arte culinária consiste justamente em não se recorrer à arte culinária”. Deve-se limitar ao mínimo possível a interferência da tecnologia no gênero alimentício e deve-se consumi-lo o mais próximo possível do seu estado natural. Essa “arte culinária sem arte” é representada pelo “sashimi”, prato da mais extrema simplicidade que consiste em fatiar o peixe cru e comer com raiz forte e shoyu, condimentos originais do Japão. E a degustação do “sashimi” veio sendo considerada pelos japoneses a iguaria de mais alto nível.

No mundo, nas culturas de consumo de carne, desenvolveu-se a utilização de condimentos fortíssimos para encobrir o seu cheiro. Entretanto, na culinária japonesa em que a carne não era utilizada e na qual se valoriza o sabor natural do ingrediente, os condimentos fortemente estimulantes eram considerados “demasiadamente artificiais e prejudiciais ao sabor natural do ingrediente”.
Assim sendo, aromas fortes como alho, pimenta do reino e pimenta vermelha raramente eram utilizados na preparação dos pratos; eram mais apreciados como produtos medicinais do que como condimentos. Outrossim, não se possuía o hábito de utilizar gorduras animais ou manteiga na cozinha, e o uso de óleo vegetal para preparar a comida era muito limitado.

O tempurá, que é um prato de peixe, verduras e outros, fritos no óleo vegetal, atualmente é considerado um dos pratos culinária japonesa, mas a sua história é relativamente recente. Acredita-se que a origem do tempurá está na fritura que os portugueses que aportaram no Japão no século XVI transmitiram aos japoneses.
A estética própria da culinária japonesa desenvolveu-se com base na filosofia que prega que “O ideal da cozinha é não cozinhar”. Isto é, busca-se servir os alimentos em um estado próximo ao natural, sem deixar aparente na superfície as técnicas artificiais. Com isso, descartam-se os pratos cujas cores e formas dos ingredientes se tornam irreconhecíveis por estarem cobertos de molho e faz-se o arranjo dos pratos de modo a valorizar suas formas e suas cores naturais.
Na cozinha européia do passado ou na chinesa da atualidade, cujo hábito é fazer as refeições com as pessoas sentadas ao redor de uma mesa se servindo da comida disposta em grandes travessas, desenvolveu-se a forma de arranjar os pratos valorizando os princípios da geometria e da simetria.
Em contrapartida, na cozinha japonesa tradicional, preza-se a estrutura assimétrica. Segundo a estética japonesa, o arranjo geométrico e simétrico é evitado por ser pensado como demasiadamente artificial. Além disso, como na maneira tradicional de servir a refeição cada um tinha a sua mesa de refeição individual (como as bandejas com pés para o café da manhã na cama do Ocidente); o olhar de quem comia estava direcionado a uma única direção, não havendo, portanto, a necessidade de se fazer um arranjo simétrico.
Na refeição feita com mesas individuais, o prato é servido individualmente (cada acompanhamento em uma vasilha separada) e com isso desenvolveram-se as vasilhas de cerâmica ou laqueadas de tamanho pequeno e de formas variadas. Como muitas vasilhas tinham desenhos, desenvolveu-se a técnica de arranjar a comida de forma a harmonizá-la com esse tipo de recipiente.


Outra peculiaridade da cozinha japonesa é a valorização da sazonalidade. A característica da literatura tradicional do Japão, na qual as variações das quatro estações são nítidas, foi de envidar esforços para expressar as mudanças da natureza de acordo com as estações do ano. Em um dos tratados de “haiku”, que é poesia “tanka” japonesa, há a regra que obriga a inserção de palavra que represente a estação, dentro da configuração de uma poesia de apenas 17 sílabas. Da mesma forma, na culinária japonesa, considera-se que devam ser servidas comidas diferentes de acordo com a estação do ano. Cada variedade de peixe ou verdura deve ser consumida na época em que apresenta o seu melhor sabor e é dada importância a “comer a estação”. Dizia-se que adquirindo de primeira mão as verduras ou peixes de cada estação e comendo esses produtos antes dos outros, podia-se ter 75 dias de vida a mais. Como na culinária japonesa é exigida a representação de tal estética da natureza, a característica de “apreciar a apresentação”, além do sabor, tornou-se forte.
Em 1868, quando foi derrubado o sistema feudal do xogunato Tokugawa vigente até então e houve a consolidação do governo moderno no Japão, foi liberado o consumo de carne. A meta nacional do novo governo era inaugurar as indústrias modernas e formar forças militares modernas para fazer frente aos estrangeiros que queriam colonizar a Ásia. Para isso, havia necessidade de formar trabalhadores e soldados com físico forte e saudável.
Os intelectuais da época achavam que a estrutura física franzina dos japoneses, em comparação com os ocidentais, era causada também pelo hábito alimentar tradicional de não consumir carnes e leite, entre outros. Por isso, a população foi incentivada a alimentar-se de carne e a beber leite.
O “sukiyaki”, que é um prato representativo da culinária japonesa que usa carne bovina, consolidou-se depois de meados de séc. XIX, após a permissão do consumo da carne. Devido à carência de técnicas tradicionais na culinária japonesa para o preparo de carne, o modelo foi buscado nas culinárias ocidentais e chinesa. Por exemplo, o “tonkatsu” (carne de porco à milanesa) é um prato de origem européia, mas enquanto na Europa é frito com um pouco de gordura ou de manteiga, no Japão é preparado com bastante óleo vegetal, seguindo a tradição de tempurá. Após fritar, o bife é cortado em pedaços pequenos para poder ser comido com “hashi”, colocando-se molho inglês comprado pronto.

Para os japoneses, mesmo que tenham tomado conhecimento da carne e demais pratos de origem estrangeira desde o final do séc. XVIII, esses pratos eram para refeições fora de casa. No lar, era comum continuar comendo pratos tradicionais, tendo o arroz como destaque principal. A grande transformação no hábito alimentar ocorreu na década de 1960, quando se inicia o grande crescimento econômico. Com a economia estabilizada, passou-se a utilizar com freqüência a carne, a manteiga e o óleo nos pratos do dia-a-dia, e houve uma diminuição no consumo de arroz. Como se passou a comer uma variedade de pratos deliciosos, o consumo do “gohan”, que era o prato principal, teve uma redução proporcional.

Do ponto de vista nutricional, o aumento do consumo de proteína animal fez a nutrição dos japoneses alcançar um equilíbrio ideal. Excetuando-se o uso de sal, que está acima do desejável, estatisticamente o povo japonês passou a fazer as refeições mais balanceadas do mundo. O fato do Japão ter se tornado o país de maior longevidade do mundo é atribuído aos seus hábitos alimentares saudáveis.
 
Influenciada pelos chineses e desenvolvida em uma época em que o Japão esteve isolado do mundo, a culinária japonesa tem a soja como seus principais ingredientes.
Algumas crenças budistas proibiam o consumo de carnes juntamente com elementos da natureza o que restringia a escolha alimentar dos japoneses levando-os a fazer com que seus principais ingredientes da comida japonesa fossem os frutos do mar, o arroz, os vegetais, o macarrão, as frutas, os derivados da soja e as conservas. Com a desculpa de trazer o cristianismo, espanhóis e portugueses chegaram ao arquipélago apresentando consigo a permissão para comer carne de vaca e também as frituras em óleo e os doces, mas a permanência destes foi muito rápida, logo o Japão fechou seus portos para estrangeiros e expulsou o cristianismo e apenas algumas receitas que levavam carnes sobreviveram, seguindo assim com o peixe.
 
Baseados em tradições milenares, os pratos japoneses são simples e ao mesmo tempo ricos, os alimentos são classificados pelo método de cozimento, yakimono (grelhados), nimono (cozidos), mushimono (no vapor), agemono (empanados e fritos) e o sushi (crus), além dos legumes, que são todos picados bem pequenos para facilitar o uso dos hashis (os pauzinhos que são os talheres da cultura japonesa) e também o marco inicial da culinária, o arroz, que está presente em quase todos os pratos preparados.
Os pratos orientais costumam ser bem diferentes coloridos e exóticos, do que estamos acostumados aqui no ocidente, os japoneses gostam dos alimentos frescos e de preferência crus o que deu origem aos sashimis, peixes e frutos do mar são fatiados e servidos com apenas alguns molhos de acompanhamento geralmente o shoyu.
Já os sushis carregam uma grande concepção de erros, muitos acham que eles são preparados apenas com os peixes crus, o que na realidade não funciona, o peixe é um dos muitos ingredientes que podem ser acrescentados ao sushi, o arroz é o ingrediente principal, grãos pequenos são cozidos cuidadosamente até terem consistência pastosa, são misturados com açúcar, sal e vinagre especial para arroz, embora inclua o peixe, os sushis também abrangem os vegetais, as algas marinhas e as ervas enroladas no arroz.
Outro prato típico dos japoneses é o famoso yakisoba (basicamente macarrão sobá frito) geralmente são preparados com repolho, cenoura, couve-flor, cebola, brócolis e outras verduras mais a carne de frango desfiada e temperada com molho shoyu e óleo de gergilim, mistura-se então o macarrão até que este frite um pouco.
Ao olharmos com as lentes de nossa cultura, tudo isso soa muito estranho, mas atualmente muitas pessoas no Brasil e em outros países ocidentais consomem as iguarias japonesas, por ser uma culinária leve, saudável e quase sem tempero, é possível apreciar o verdadeiro gosto dos alimentos e ainda obter uma saúde melhor.
A corrente principal da filosofiade arte culinária nomundo, observada prototipicamente na culinária chinesa e francesa preconiza: “Arte culinária significa transformar, com o uso de técnicas criadas pelo homem, em comestível aquilo que não pode ser consumido in natura. Outrossim, arte culinária é a criação de sabor não existente na natureza”.

A História da Bebida Japonesa Saquê


O que há de tão especial na bebida alcoólica obtida com a fermentação do arroz, que comparativamente ganha de longe até mesmo do vinho, no quesito tradição? Essa e outras perguntas já devem ter passado na cabeça de muita gente quando se ouve falar na milenar bebida japonesa: o saquê.
Famosa por estrelar diversos filmes ao lado celebridades de Holywood, como no recente “ O Último Samurai”, a bebida um dia já foi considerada alimento. Em meados do século V a.C., no período Nara, os produtores não conheciam técnicas apuradas de fermentação, e o saquê era feito com pouco álcool e água, em uma combinação que mais lembrava uma porção de mingau do que outra coisa... Nessa época, “comia-se” o saquê de hachi, direto de uma tigela. Na verdade, tudo era o resultado de uma receita com pormenores um tanto repulsivos: mascava-se o arroz para fermentá-lo com a saliva e depois cuspia-se em tachos para só então iniciar o preparo da bebida. Esse método era chamado de “Kuchikami no sake”, ou saquê mastigado na boca. Já na província de Hokkaido e em áreas rurais de Okinawa, os fãs da bebida encontraram outras maneiras de “purificar” esse processo, determinando que apenas as jovens mulheres virgens poderiam mastigar o arroz, pois elas eram consideradas representantes dos deuses aqui na terra. Logo não demorou, e a bebida produzida por elas foi batizada de “bijinshu”, saquê de mulher bonita. E por incrível que pareça, essa prática sobreviveu até poucos séculos, mesmo após a adoção de técnicas mais modernas de fermentação.

Diz a lenda que a fermentação da bebida foi descoberta por acaso: “Certo dia, um cidadão desleixado esqueceu de tampar um tacho de arroz que cozinhará e o arroz acabou mofando. E como ele era realmente desleixado, também o esqueceu de jogar fora e só depois de alguns dias “notou” que havia ocorrido uma fermentação e o arroz então, transformara-se em uma deliciosa bebida, na verdade mais pastosa do que líquida. A total falta de cuidado do cidadão, acabou se transformando então, em um método e os produtores descobriram que o fungo que mofara o arroz era o responsável pela transformação do amido em glicose e fermento. Logo, o fungo ganhou nome “kamutachi” e não demorou muito para que os produtores divulgassem que a bebida era “produzida pelos deuses”.

Até o século passado, o saquê ainda era produzido artesanalmente, onde o arroz era primeiro lavado e depois colocado em tinas (vasos gigantes) para cozinhar. E após esta etapa de fermentação, a pasta resultante era ralada e só então, misturada manualmente até chegar ao produto final. No entanto, atualmente os grandes fabricantes japoneses ainda utilizam métodos que lembram esse antigo processo. E hoje, o saquê é feito em grande escala industrial e não há mais vestígios do romantismo do passado. Pelas leis do país, a produção caseira da bebida é proibida.
E como os tempos mudam, o “kamutachi” também mudou de nome e hoje é conhecido como “koji”. E é ele quem determina o aroma e o gosto do saquê, uma difícil tarefa para os “tojis”, pois eles que escolhem o fungo que garantirá um sabor ainda mais especial à bebida. O que permanece inabalável, no entanto, é a popularidade do ritual.

Beber saquê é um ritual no país, e existem várias razões pelas quais a bebida é apreciada, que vão muito além do paladar, sede ou disposição para encher a cara. Segundo a tradição, bebe-se saquê para eliminar as preocupações e prolongar a vida, e isto por si só, vale qualquer dose a mais. Pega até mal chamar de bêbado quem toma saquê de forma exagerada e sai cambaleando de madrugada pelas ruas das cidades japonesas. Inebriado talvez fosse a designação correta, uma vez que os efeitos da bebida transformam seus apreciadores em cantores, galanteadores e seresteiros ao luar nas noites nipônicas.
No Japão, costumam-se dizer que o saquê é o melhor companheiro na solidão. Só não se pode toma-lo em qualquer copo ou em qualquer ocasião. Bebe-se em grandes comemorações como no Ano Novo e nas cerimônias xintoístas de casamento, em encontros românticos e também na falta de um pretexto feliz ou dor de cotovelo.

Na maioria das ocasiões, o saquê é servido quente em uma temperatura que varia entre 40º e 55º C. Mas ele também pode ser tomado gelado ou misturado a outras bebidas e sucos, originando coquetéis muito interessantes. A maneira mais tradicional de servi-lo é em xícaras quadradas de madeira, chamadas “masu”, que conferem à bebida um suave sabor amadeirado. Nesse caso, sempre é servido frio com temperatura variando entre 20º e 40º C, uma vez que o saquê quente absorveria o gosto da madeira. Em muitos lugares, sugerem-se ainda que coloquem uma pitada de sal no canto do masu, um certo estilo adotado pelos jovens.
Rituais à parte, os efeitos “inebriantes” do saquê vão muito além das histórias fantásticas da antiguidade.

O saquê é a bebida com mais alta porcentagem de álcool entre os fermentados do mundo. Sem ser diluído, chega a marca de 20% de teor alcoólico, enquanto uma cerveja não passa de 5% e o vinho de 12%. Mesmo assim, com menos álcool, ambos estão ganhando a queda-de-braço com o saquê no mercado japonês. Em 1872, quando a bebida era um dos principais produtos da economia do país, havia 30 mil fabricantes, hoje o numero não chega a 10% do total. São cerca de 2.300 produtores que fabricam anualmente, pouco menos que um bilhão de litros de saquê. O que não quer dizer que a bebida está em declínio, pelo contrário, alguns tipos de saquê atingem cifras absurdas, ganhando o status de bebida, como o saquê produzido na província de Hyogo, considerado o melhor do país. Uma simples garrafa pode custar até 300 mil ienes. E mesmo que a cerveja e o vinho continuem roubando espaço do saquê no Japão, uma coisa é certa: ele está na lista dos principais persongens da história do país e os japoneses não o deixaram de beber, pelo menos em comemoração a isso. E como beber saquê no Japão, é um ritual milenar e os excessos são jusificados por milhares de anos de história, o modo mais simples de se desculpar por qualquer estrago provocado em uma noite de bebedeira no Japão, é dizendo “Eu estava bebendo saquê...”. e o perdão é praticamente certo, seja qual for o dano causado.