quinta-feira, 16 de junho de 2011

Espetacular Chef Alex Atala

Entrevista com Chef Alex Atala

Ele foi punk, DJ, pintou paredes na Europa, descobriu a cozinha por acaso e, considerado o melhor chef de São Paulo, diz que tem prazer em comer coisas simples.
Ele apresenta programa de televisão, já desfilou para o estilista Ricardo Almeida e está na lista dos 25 homens mais sexy do Brasil. Apesar de todas as credenciais de celebridade, o verdadeiro lugar do paulistano Alex Atala, 37 anos, é na cozinha. Apresentador do Mesa para Dois, do canal a cabo GNT, Atala foi recentemente eleito o melhor chef de São Paulo pelo trabalho à frente do seu conceituadíssimo e badalado restaurante D.O.M. – onde um jantar sem vinho não sai por menos de R$ 100 por pessoa e algumas refeições, como o menu-degustação, composto por oito pratos, podem ultrapassar os R$ 200. Ex-punk e ex-DJ do Rose Bom Bom (boate ícone da noite paulistana dos anos 80), Atala tem três filhos: Pedro, 11 anos, de seu primeiro casamento, e os gêmeos Joana e Tomás, de 3 anos, da relação com a estilista Márcia Lagos, sua mulher há seis anos. Na sexta-feira 30, o chef dará uma das aulas mais concorridas do Boa Mesa, tradicional evento gastronômico que acontece até 1º de outubro, em São Paulo.
 
 
 
 
Cozinhar é uma arte?

  • Cozinhar é muita coisa, trabalhar é outra. Fazer comida e servir implica uma tremenda generosidade. Você se entrega para o prazer das pessoas, é muito prazeroso. Trabalhar com cozinha é outro mundo.
Quais são as diferenças?
  • Cozinhar implica praticamente só prazer e a possibilidade de uma frustração. Quando você está atuando profissionalmente na cozinha, você sofre duas pressões. A primeira é pela perfeição: ficar bom ou muito bom é só a sua obrigação. A segunda é a do tempo: a pessoa não veio assistir a um espetáculo, ela veio para comer, e a fome e o mau humor estão muito próximos. As pessoas vêm com fome, uma expectativa alta, e você tem que servir uma comida muito boa e muito rápido. Multiplique isso pelo número de mesas, pelo de pessoas e pratos que elas vão experimentar, e você vai ver que isso é um ponto de tensão absurda. Essa tensão rouba muito a beleza de cozinhar.
Hoje você é uma celebridade. Essa exposição é boa para divulgar o chef Alex Atala?

  • Tenho um duplo sentimento com essa coisa de ter virado um personagem. O que implica a palavra celebridade não me é bem-vindo. Mas foi muito prazeroso, por exemplo, desfilar para o (estilista) Ricardo Almeida. Essas ações tem o ônus e o bônus. O reconhecimento profissional é bônus. O lado celebridade é mais ônus do que bônus. O excesso de exposição não me encanta. Não é legal também ter uma imagem distorcida do que você é e do que você faz todo dia. Infelizmente acho que acabo externando uma riqueza que não tenho. As pessoas acham que o restaurante é uma fonte de milhões, e não é. É um negócio como outro qualquer, não é mais importante nem mais rentável do que uma loja.
Como se interessou por cozinhar?
  • Minha história é nada ortodoxa. Era garotão, tinha 19 anos e trabalhava como DJ em São Paulo para viver. Juntei uma grana e fui para a Europa. No meio da viagem meu dinheiro acabou, e eu queria ficar. Comecei a pintar paredes. Mas, para conseguir um visto, tinha que fazer um curso e resolvi fazer uma escola de cozinha porque tinha um amigo que também fazia. Atirei no que vi e acertei no que não vi.
O que gosta de comer no dia-a-dia?

  • A boca é um instrumento do cozinheiro. Como de tudo e tenho um tremendo prazer em comer a coisa mais simples. Adoro levar meu filho ao estádio de futebol e acho que pago caro pra caramba quando compro aquele cachorro-quente de um R$ 1 porque ele não vale R$ 1. O pão é ruim, a salsicha é ruim. Mas é um tremendo prazer comer um hot-dog ruim e caro com meu filho no estádio. É pelo momento. Prefiro mil vezes comer uma comida ruim com quem me dá prazer a comer bem com um bando de chatos. Comer não é só o que está no prato, é um momento de prazer e implica muito mais do que a boca, é o que está em volta.
 
 
 
Qual a coisa mais exótica que já comeu?

  • Já comi muita coisa esquisita na vida. Meu critério de escolha para viagens é: quanto pior, melhor. Na Amazônia, comi turus, que eu acho sensacional. É um verme que dá nos troncos de madeira no mangue. Você tira o verme do mangue e come, vivo e cru, na hora. Acho mágico. Paladar é um horizonte para ser aberto. Uma criança não nasce gostando de amargos, de pimentas, de alcoólico. Com os anos, experimentando, se expondo a esses sabores, a gente começa a tolerar, para depois apreciar.
Qual sua culinária preferida?

  • Gosto muito de comida rústica, não importa o lugar do mundo. Receitas regionais me emocionam. O sabor da comida de alma, secular, é uma referência muito grande no meu trabalho.
Por que cozinha estrelada é sempre tão cara?

  • Caro e barato são conceitos relativos. Caro é o que você paga e não recebe. Se alguém vem ao D.O.M. e, independente da conta, sai frustrado, o D.O.M. é caro. Agora, se veio ao D.O.M., comeu bem, pagou bastante dinheiro mas saiu feliz, não pagou caro. Por quê? Porque tenho o cara que planta ervas para mim, uma equipe de 23 cozinheiros, uma equipe de sala de quase 30 pessoas, um escritório para organizar tudo. Tem mais: imagine um peixe de um quilo. Tem o miolo do filé que é bonito, um pedaço perto da cabeça e outro perto do rabo. Não vou fazer desconto para o cliente que ficar com o rabo, então não posso servi-lo. Tenho que servir o miolo do filé, com o mesmo padrão, para todos. De um saco de laranja às vezes você tira só dez laranjas. Você tem que buscar os melhores produtos para ter os melhores resultados. Por isso é caro.
Você realmente cozinha no D.O.M.?

  • Toda noite estou dentro da cozinha. Durante o dia, às vezes me programo para estar dentro da cozinha, mas acontecem coisas que obrigam a deixá-la. Meu dia é muito mais feliz e saudável quando fico na cozinha. Eu fumo, mas não gosto de fumar. Tenho uma relação ruim com o cigarro – preciso dele, mas não gosto. Quando estou dentro da cozinha, obviamente eu não fumo e nem dou escapadinhas para fumar. Agora, me tranca no escritório e me deixa lá, fazendo contas. Eu como um maço de cigarros.
Seus filhos gostam de brincar de cozinhar?

  • A menina brinca de panelinha, lógico, o Tomás às vezes fala: “Vou cozinhar no D.O.M.”. O Pedro, o mais velho, tem outra relação com a cozinha. Se algum deles for cozinheiro, vou ajudar muito, mas espero que não sejam. Não quero que eles cresçam com obrigações, nem de ser cozinheiro nem de comer só coisas maravilhosas. Então, levo meus filhos ao McDonald’s, e como junto. Não sou aquele pai que leva e diz: “Isso é uma porcaria”. Como junto porque é um prazer estar vivendo aquele momento com eles. Não quero que eles sigam o ofício por causa da devoção que você tem de ter, deixar de ter vida pessoal em favor de uma profissão. As relações equilibradas são as perfeitas, e acho minha relação com cozinha descompensada.
 
Tem saudades dos tempos de DJ?

  • Foram tempos ótimos mas pertencem a um momento da minha vida. Fui ao Rose Bom Bom depois que reabriram, estava superbacana, mas... Só seria igual se montassem uma máquina do tempo. Hoje em dia adoro jazz. Graças a Deus sou um cara que fui abrindo meus horizontes, não só no âmbito gastronômico, mas também no musical. Fui punk, achava que quem tinha dinheiro não prestava. Hoje, consigo achar gente boa e ruim em toda parte. Não sou mais um cara que segrega, nem na música, nem gastronomicamente, nem socialmente.
Você é formado em gastronomia?

  • Sou um cara que deu certo de tanto fazer errado. Terminei o colegial depois de cinco expulsões. De um mesmo colégio fui expulso duas vezes: os caras me perdoaram e fui reincidente. Era um bom colégio, a média para passar era 3, fui um bom aluno (risos). Fiz um curso técnico, minha formação de cozinheiro é técnica, não fiz faculdade.
Quem cozinha na sua casa?

  • Eu adoraria cozinhar em casa, só que estou no D.O.M. seis dias por semana, no almoço e no jantar. Tenho um dia por semana para dar uma descansada, ficar com os filhos. Às vezes, aos domingos, faço um almoço para os amigos, e, à noite, em vez de pedir pizza, o que faço com bastante freqüência, vou para a cozinha e faço alguma coisa. A Márcia sabe cozinhar mas acho que ela morre de medo de fazer comida para mim. É uma relação que ela ainda não venceu (risos).

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